Histórias de vida

Pelotas - RS

"Sempre digo que sou merecedora" - Clair Rockembach Crizel

As minhas netas ficam comigo, mas hoje elas não vêm porque a mãe delas vai trabalhar só à tarde. Eu sempre cuidei delas, sempre com paciência porque era bom para mim, porque elas acabavam me ocupando... naquele momento em que eu estava ali, com elas, eu não ficava pensando no meu problema, não estava pensando na doença. Era “Vó, me alcança água!”, “Vó, faz um mingau para mim?”... Quer dizer, precisava daquilo para que eu não ficasse apavorada e isso foi muito bom.  Não teve um dia em que eu dissesse: “Não! Hoje eu estou com mau humor”, “Hoje eu não tenho paciência”...  Elas me ajudaram muito, além do carinho que recebi, por que são crianças, mas entendem que tu estás passando por alguma situação difícil. Eu tenho fotos até da Lívia, de 11 anos. Eu estava sentada aqui nesse sofá, carequinha, com uma aqui ao lado e a outra beijando a minha careca.  A pequena, de 6 anos, me beija e passa a mão na careca e isso faz bem, porque tu sabes que é aquele carinho verdadeiro que é muito bom!

Quando descobri que estava com câncer as pessoas diziam que eu deveria cuidar mais de mim, me preocupar mais comigo do que com os outros, porque eu sempre cuidava muito das minhas netas, sempre ficava em função delas. Eu não mudei porque descobri a doença, acho que não deve ser assim, de dizer “agora eu não vou mais cuidar delas porque tenho que me cuidar”. Fiz a cirurgia, passei por tudo o que passei com elas sempre ao meu lado. Elas me deram muita força, carinho, amor. Isso é muito gratificante, é muito bom! E estar sempre com elas, elas sempre comigo, é muito bom isso! 

Quando eu fiquei careca, o carinho, o amor... elas passavam a mão na minha cabeça com carinho, eu tenho fotos disso, beijavam a minha careca. A pequena de 6 anos contou na escolinha: "A minha avó tá com dodói! A minha avó tá fazendo um tratamento! A minha vó perdeu o cabelo", contava tudo. As professoras, quando me encontravam, me falavam. Eu nunca tive problemas por estar careca. Dentro de casa não usava lenço, não escondia... eu só usava o lenço quando ia fazer o tratamento, a quimio ou alguma coisa por causa das pessoas em si, não por minha causa. Dizer "tô com vergonha de ficar careca", não! Mas as pessoas te olham de outra maneira: “Ai! Coitada! Olha ali! Ela tá com câncer! Ela perdeu o cabelo!". Aí querem saber o que houve e te perguntam. Por isso é que eu usava o lenço, mas no momento em que eu parei com a quimio já comecei a andar sem normalmente, o cabelinho estava crescendo e eu já comecei a não usar mais nada. Nunca usei peruca! Era lenço no verão e no inverno usei touca. Adorava! Botava uma toquinha e saia, nunca escondendo... “tu não esconde de ti, tu esconde dos outros. Os outros te olham de outra maneira...". Hoje eu falo abertamente, tenho fotos no face careca. Fiz umas fotos com uma moça que me convidou, junto com outra moça lá do IBA, e eu fiz, tranquila, carequinha, sem nada. As fotos ficaram muito bonitas e tudo isso eu guardo. Às vezes o meu filho diz pra eu apagar essas fotos, ou as da mama, da cirurgia, as fotos de uma rejeição que eu tive em uns pontos que ficaram feios...  tudo isso eu tenho, guardei pra futuramente olhar e ver, "olha tudo que eu passei, eu tô aqui, eu tenho fé, eu acredito e eu venci!”. Não tenho esse problema de esconder, apagar, isso é coisa do passado... fez parte da minha vida. Eu tenho tudo isso no meu celular. Ninguém nunca me ouviu reclamar de dor, eu nunca reclamei! A radioterapia me queimou um pouquinho, mas nada que não deu para suportar. Eu sempre tive muita fé, desde o momento que eu descobri que estava com câncer.

A minha vida é assim, eu trabalho em um consultório médico no turno da tarde, então é tranquilo. Cuido das minhas netas só no final de semana quando os pais estão trabalhando. Quando eu chego do serviço elas vêm e ficam sempre “na minha volta”. Bom, então eu estava trabalhando normalmente, nunca tive nada de dor no seio, de sentir alguma coisa. Eu descobri porque ouvi a minha cunhada contando sobre a minha sogra, que teve câncer de mama, ela dizia que a sogra teve uma retração de pele, mas eu não sabia o que era. A retração é quando a pele entra, suga. Eu não tinha visto a minha sogra com isso. 

Quando eu tomo banho, normalmente saio do banheiro e venho aqui para sala secar a axila e colocar o desodorante. Venho aqui e me olho no espelho. Toda vez que eu levantava o braço eu via essa retração de pele, que eu não sabia que se chamava retração. Eu achava estranho e me perguntava o que seria, tinha duas partes que entravam, como se estivesse sugando. Passaram-se uns dias e eu não falei nada para o médico onde eu trabalho, que é endócrino. Fiquei desconfiada, mas não falei nada. Me olhava todos os dias e via aquilo, aí eu pensei, “vou marcar uma consulta e ir no médico só para pedir uma mamografia e um ultrassom para ver o que é isso”, mas um dia eu me deitei, e pensei em me tocar no sentido de onde vinha aquela retração na pele, aí quando chegou perto do mamilo eu senti um caroço e era uma coisa bem palpável. Eu fiquei apavorada, mas primeiro eu tinha que fazer o exame para ver o que era, e fiquei me perguntando de onde teria surgido. Marquei a consulta e fui ao médico. Pedi uma mamografia, uma ultrassonografia e mais nada, disse a ele que me apareceu alguma coisa diferente e que eu queria ver o que era. Ele disse que iria me examinar e me daria o pedido. Aí eu fui em uma clínica onde uma amiga trabalha há anos e está acostumada a fazer mamografia. Cheguei e falei para ela que estava desconfiada, que descobri um caroço que dava pra perceber nitidamente. Fui para a sala e tirei a roupa, levantei o braço e mostrei. Ela não me falou nada, mas pela cara dela eu vi, porque ela olhou e disse pra eu não me preocupar que não ia ser nada! Aí ela fez a primeira mamografia, que não mostrou nada, fez a segunda e não conseguiu ver. Ela me passou para a outra sala, onde o médico faria o ultrassom. Ele fez o exame e me disse que tinha algo, mas que não era pra eu me apavorar porque ele não via nada sério, que não era o que eu estava pensando, mas para que eu não ficasse com dúvidas ele sugeria uma biópsia. 

No outro dia fui direto em uma clínica em que trabalham umas gurias que eu conheço e disse que precisava fazer uma biópsia porque o meu exame estava sugerindo que tinha um nódulo. O médico achava que não era nada, mas tinha alguma coisa diferente. Fiz a biópsia, o médico colheu o material e não me falou nada na hora. Foi 100% satisfatório o material que ele colheu e o resultado ia sair em tal dia, tal hora. Nesse dia, eu estava no serviço à tarde, umas 18h., só eu e o médico, ele na sala dele e eu na minha. Eu tinha como acessar pela internet para saber o resultado e fiz isso. Entrei no site do laboratório, cliquei e olhei, neoplasia de mama, na verdade deu carcinoma de mama invasivo, uma coisa assim. Eu olhei aquilo e o meu chão se abriu. Chamei o doutor, já aos prantos. Ele veio, olhou e disse pra eu não me apavorar, que nós íamos fazer tudo que tivesse que fazer e que ligaria agora para o meu médico, que tinha sugerido a biópsia. O doutor falou que eu tinha consultado e visto o resultado pela internet e o meu médico disse que eu teria que ir lá, para ver quais seriam os passos. Naquele dia, o médico com quem eu trabalho me trouxe em casa e nós viemos conversando. Ele me deu todo o apoio e esteve ao meu me ajudando em tudo. No dia seguinte marquei consulta com o meu mastologista e ele me disse que ou eu faria a cirurgia ou começaria a quimio. Ele iria decidir isso com base nos resultados dos exames e me ligaria para avisar, o que foi feito logo em seguida, indicando que o primeiro passo seria a cirurgia.

Descobri a doença em novembro de 2016 e em dezembro eu trabalhei até o dia 21. Internei no dia 22 e fiz a cirurgia e no dia 23 eu já estava saindo do hospital. Trabalhei até o último dia que pude, tranquila e fiz a cirurgia. O médico colheu todo material que ele retirou, porque eu poderia ter que passar por outra cirurgia se os linfonodos dessem resultado positivo, e nesse caso a doença já estaria na axila. Então ele colheu dois dos linfonodos e mandou para exame. Tudo o que ele tirou da mama dos dois lados, parte superior e inferior, também foram enviados e ficamos aguardando os resultados. Quando chegaram os resultados eu levei para ele, que me disse: "Qual noticia tu quer? A boa ou a ótima?”. A doença não estava na axila, era só na mama e o próximo passo seria as quimios, as rádios e o tratamento, sem precisar de outra cirurgia. Eu dei um abraço nele e fiquei mais tranquila em saber que o que eu tinha era ali na mama, mas que não tinha avançado e que talvez eu não precisaria fazer outra cirurgia depois. Eu fiquei bem assim, pensando: “Agora vamos lutar, vamos vencer! Não vou me entregar e vamos lutar por que essa doença não vai me derrubar”. Então fiz as quimio e as rádio. Teve um episódio com a quimio em que eu fiquei ruim, tive uma diarreia durante o dia todo e tive que fazer soro. Eu me alimentava bem, tem gente que perde o apetite e que fica mal, indisposta. Eu vinha para casa depois da quimio, me deitava, descansava. Como era verão, muito quente, sentia uma indisposição até pelo tempo, mas fiz tudo tranquila, as 4 quimios que tinha para fazer eu fiz. Depois, quando acabaram as quimios, fiz as rádios, que também foram tranquilas, mas me queimaram, fiquei em carne viva. Quando a água do banho caía ali na região queimava, mas melhorou, passou. 

Sempre tive força, sempre fiz sem reclamar, em momento nenhum eu questionei a Deus o porquê isso aconteceu comigo. Porque tinha que ser e hoje eu acho que ele me aliviou muito e ainda agradeço. Eu penso que apareceu em mim porque tinha que aparecer, porque eu tinha que passar por isso, são coisas que a gente tem que passar para aprender alguma coisa. O que eu aprendi de tudo isso foi que cada vez mais devo ser uma pessoa boa como eu sempre fui, fazer o bem para os outros, ajudar a todo mundo e não dizer não para ninguém. Estou sempre pronta para ajudar todo mundo. Deus achou que eu era merecedora, uma pessoa boa de coração e me deu a cura. Eu passei por tudo isso, mas Ele sempre esteve ao meu lado me dando força. 

Teve noites em que que eu passei pensando, deitava, chorava, dormia e acordava na madrugada pensando se a doença acabaria comigo, o que ia acontecer, pensava nos meus netos, no quanto eu queria conviver com eles ainda, e Deus sempre me dando força. Ele está sempre comigo, ao meu lado, me ajudando e me dando forças... e para todas as dificuldades ele sempre tem uma saída. Ter que esperar pelo SUS ou pela FAU... Fiz tudo pela FAU, a cirurgia em si, mas as portas se abriam e tudo era rápido. Eu tinha a ajuda do meu patrão, que sempre dava um jeitinho. Então nada foi difícil ou demorado para mim, as coisas sempre foram rápidas. 

Sempre digo que sou merecedora porque, sabe aquela pessoa que durante 24 horas da tua vida corre para ajudar todo mundo? Eu sou assim! Deixo de pensar em mim para ajudar os outros, pra fazer pelos outros, nunca disse não. As pessoas dizem para eu pensar um pouco mais em mim, me cuidar, mas eu me cuido, do meu jeito, mas me cuido. Eu fiz a cirurgia e no outro dia fui embora. O meu filho mais novo disse para eu ir para a casa dele, porque ele sabia que se eu viesse para casa eu ia limpar, arrumar, não ia ficar parada, ia ficar cuidando dos netos e eu fui, mas a minha cabeça estava na minha neta pequena de 6 anos que mora pertinho de mim. Eu pensava em quem ia ficar com ela, porque o meu filho e a minha nora trabalham. Fiquei 3 dias na casa dele, almocei lá no dia de Natal e depois vim embora. Ele ficou me perguntando como é que eu ia tomar banho, como é que eu ia levantar o braço, como é que eu ia fazer as coisas... Eu disse que faria devagar, com jeitinho e vim para casa. Em casa não deixei de fazer nada. Arrumava tudo, tomava meu banho, com 3 dias de cirurgia já estendia a roupa, não precisou de ninguém para me cuidar, foi tranquilo. Na segunda-feira a minha pequena veio para cá também. 

Quando tu moras sozinha tu sabes que se precisar tem os filhos, as noras. Cada um tem a sua vida e eu acho que tu não tens que ficar ocupando as pessoas ou incomodando. A nossa vida é muito corrida, todos têm as suas coisas para fazer, o seu dia a dia. O meu filho mais novo viaja, está sempre na estrada, e o outro trabalha o dia todo, então, como é que eu vou ficar ocupando, incomodando? Sempre procurei fazer as minhas coisas e resolver sozinha. Nas 4 quimios, em duas um filho me levou e nas outras o outro filho. Eles se revezaram, mas os dois estavam sempre comigo para fazer exames, para fazer a quimio. Já na rádio eu já não precisei de ninguém porque não tinha necessidade, é rápida e não tem porque levar uma pessoa. Fiz trinta rádios e eu ia e vinha sozinha. Também tinha as minhas cunhadas, eu tenho só dois irmãos, que se ofereciam, mas não tinha necessidade. Se eu precisasse eu chamaria. Nós aprendemos a nos virar. Não sei se todo mundo tem essa mesma força, mas eu tenho, eu me viro. Cada um sabe da sua necessidade. Tem aquelas pessoas que acham que se estão ruins precisam de alguém, mas eu estava bem, só o lado emocional que fica abalado. O meu filho mais velho não me deixava chorar, ele brigava. Às vezes ele chegava aqui e eu estava triste no início, quando descobri, e ele era duro, seco, para não me deixar chorar.

Depois da cirurgia eu fiz perícia no INSS e eles me deram 6 meses de licença nesse primeiro momento. Quando completou o sexto mês eu fiz uma nova perícia e me deram mais 4 meses. Então foram 10 meses que acabam hoje, e na segunda-feira eu já retorno ao trabalho. Estou ansiosa para voltar a trabalhar, porque tenho carinho com as pessoas de lá e as pessoas têm carinho por mim também.  Quando elas descobriram chegavam lá no consultório e perguntavam por mim para a outra moça que ficou trabalhando no meu lugar.  Primeiro ela não queria dizer que eu estava doente e dizia que eu estava de férias, mas no segundo mês começaram a desconfiar, aí falaram que eu estava fazendo um tratamento, que tinha descoberto um câncer de mama. Pessoas de outras cidades que se tratam lá me ligaram para saber como eu estou, que queriam me ajudar, me ver. Recebia mensagens no meu celular todas as noites de uma moça que é paciente. Isso ajuda muito! Às vezes eu chorava lendo as mensagens que as pessoas me passavam, eu estava precisando de um carinho, de uma atenção e elas me davam sem saber. As pessoas chegavam lá no consultório mal e eu conversava com elas, dava uma palavra de carinho, tratava bem, isso aí fazia um bem enorme para elas e eu tive todo esse retorno. Me ligavam, me passavam Whatsapp, ficavam orando e me dizendo que estavam comigo, que eu poderia ligar caso eu precisasse, isso é muito importante e te dá uma força. Eu não sabia que eu era tão importante na vida dos amigos e das pessoas que tu conheces, e que na verdade nem eram bem meus amigas, eram as pessoas que iam no consultório. Eu sempre dei atenção pra todo mundo e conversei. Se tu vais ao consultório médico alguma coisa tu tens, tu vais para procurar uma ajuda, então tu não vais querer ser maltratado. Por isso eu sempre fui assim, carinhosa com todo mundo, e também tive esse retorno. Tudo isso é muito importante e ajuda muito.

O que eu aprendi com tudo isso é que cada vez mais eu vou ser quem eu era antes. Não vou ficar só no “pensar em mim, cuidar de mim e esquecer o resto”, vou continuar a ser a mesma pessoa, sendo amiga, ajudando, fazendo o que eu posso fazer por todo mundo. Eu me preocupo com coisas que não eram nem para eu me preocupar tanto... Se alguém descobriu que está com câncer de mama eu fico com pena. Eu fico pensando no que ela vai passar, esperando que dê tudo certo, fico rezando, pedindo para Deus ajudar, para dar um bom tratamento, para dar tudo certo. Tu aprendes que tu tens que ser o que tu és e ajudar as pessoas e acreditar em Deus. A fé é muito importante para te ajudar nessa caminhada, porque é Dele que tu precisas, é Ele que te estende a mão, é Ele que está sempre ao teu lado, porque sozinha tu nunca estás, isso é muito importante.
Eu sempre acreditei em Deus, ainda mais quando descobri a doença. Tu tens bons médicos, o médico é bom e vai fazer a cirurgia, mas na mão do médico tem a mãozinha de Deus. É com Ele que tu tens que te apegar! E se não é a tua hora, tu não vais! Tudo tem a sua hora!  Para mim é Deus, é Jesus, aonde fala Dele, onde está Deus, eu estou! Quando eu descobri a doença eu entrei em tudo o que foi igreja, desde a Catedral, a Evangélica, o Centro Espírita, em tudo, porque eu disse: “Ele é que vai me salvar, é Ele que vai me dar força”. Eu achava maravilhoso entrar. Na Catedral eu entrava, sentava, pedia, conversava com Ele, tinha aquela paz, aquela coisa de não ouvir nada, sozinha ali. Eu, à tarde, me sentava lá e ficava olhando tudo. Quando eu entrei numa evangélica, “Glória a Deus, senhor! Glória Jesus!”, aquele jeito com que eles chamam por Ele. Achei lindo! Eles têm uma fé, uma crença... Cada um com a sua religião e cada um com a sua crença. Deus é um só para todas as religiões, eu não vejo diferença. Eu acredito Nele e aonde disserem pra eu ir, que ele vai fazer um milagre, eu vou! Eu vou porque é Deus e eu acredito Nele! Fui ao centro espírita, tomava passe. São energias boas que tu recebes, renova as tuas energias. Também fui na Cascata, na Nossa Senhora de Guadalupe que o meu filho me levou. Ele fez uma promessa, saiu daqui a pé e foi até à Cascata em um domingo de manhã. Levantou umas 4h30, 5h da manhã.  Ele é muito católico, acredita, tem uma fé... Quando saiu o resultado que eu estava bem, que não ia precisar fazer outra cirurgia, eu ainda estava fazendo as quimios, um dia ele me disse: “É amanhã que eu vou pagar a minha promessa!”. Eu disse pra ele que era cedo, sozinho, caminhar até a Cascata não seria fácil. Ele me disse “Eu vou!”, colocou o tênis, pegou uma água e foi. Aí quando ele já estava a 500 metros do Santuário de Guadalupe, onde tinha as placas, ele tirava uma foto e me mandava. Quando ele chegou, tirou uma foto e me mandou! É muita emocionante tu saber que ele fez um sacrifício, pagou a promessa dele, pediu e cumpriu. Ele foi até o Santuário e agradeceu por ela estar comigo neste momento. Ele me dizia para não chorar, sempre foi durão nesse sentido. Quando eu ia chorar ele sempre foi duro para não me deixar desanimar, para não deixar eu me entregar, eu acho que era para não me ver sofrendo. Ele procurava me distrair no verão, e como eu não estava trabalhando, ele saía do serviço e nos finais de semana ele me pegava, junto da pequenininha dele, a de 6 anos, e a gente passeava, ia até para o interior, ia nesses campings. Eu não podia pegar sol, pois estava fazendo tratamento, mas eu me sentava, ficava na sombra e molhava os pés... Ele sempre queria me distrair para que eu não ficasse em casa, para não ter uma depressão, para não ficar ruim. Mesmo quando eu estava deitada ele me fazia levantar para a gente sair.

Eu tenho 58 anos, descobri o câncer no ano passado, em novembro, na verdade descobri com 57 anos. São coisas que a gente tem que passar. Na segunda eu volto a trabalhar e tenho o lançamento, no Shopping, do Buquê do Amor. Terça-feira de manhã eu tenho mamografia e ultrassonografia porque no pós-cirúrgico eu não fiz nada. Tem que esperar a quimio, tem que esperar 60 dias depois que acabam as rádios para que tu possas fazer a mamografia. Eles acompanham a pós cirurgia e é a primeira vez que eu vou fazer exames depois. Até então eu não sei como é que ficou! Acredito que está tudo bem, que não tem mais nada, mas na terça-feira eu vou saber o resultado. 

Graças a Deus eu estou bem, ainda sinto uma dor nas pernas, nas articulações, e isso incomoda bastante, mas o médico já trocou duas vezes a medicação que eu estou tomando - aquela a medicação de 5 anos que a gente tem que tomar -. Na terça ele vai trocar novamente por uma mais antiga, que é bem conhecida, porque ele disse que essa não causa essas dores articulares. Essas dores articulares que eu tenho nas pernas, principalmente nos joelhos, doem muito, mas fora isso eu não sinto nada. Depois já tenho consulta e pego o resultado, acredito que na outra semana já vou marcar com o oncologista para ele olhar e ver como é que estão os exames. Depois, de 3 em 3 meses ou de 6 em 6 meses eu volto para fazer um controle, mas a princípio, vai estar tudo bem, se Deus quiser.

Na minha família tinha eu, a mãe e dois irmãos mais novos, eu sou a mais velha. Passei muito trabalho na vida, nós éramos muito pobres e não tínhamos nem uma televisão em casa. Era o café preto e um pão sem manteiga, coisas assim. Hoje eu digo: “Meu Deus, eu sou rica! Eu estou bem! Eu tenho a minha casa, eu tenho as minhas coisas, eu tenho a minha comida, eu tenho uma boa cama, eu tenho um ventilador!”. Hoje dou valor às pequenas coisas que não tinha no passado. A minha mãe já é falecida, era uma pessoa que eu tinha uma verdadeira paixão, porque ela era tudo na minha vida. Foi uma mãe que trabalhou a vida inteira para nos dar as coisas dentro das possibilidades dela, porque o meu pai era alcoólatra. E, então, nós passamos muito trabalho, porque ele gostava muito de festa. Ele saía e a minha mãe ficava em casa.  Eu não suporto, não gosto do alcoolismo, nem de ver, nem de ouvir falar, isso marcou muito a minha adolescência. E a minha mãe para mim sempre foi tudo, sempre foi uma guerreira. Ela trabalhava para nos dar as coisas dentro do possível, pois só podíamos contar com ela. Quando ela morreu, eu disse que tinha perdido pai e mãe. O pai estava vivo, mas eu tenho limites. Não tenho raiva no meu coração, não tenho espaço para ter raiva ou ódio, mas tenho mágoa de ter passado por tudo isso, de ele não ter dado o reconhecimento do que ela era. Ela era uma mulher que acordava às 5h da manhã, tomava banho e ia para um tanque, lavar roupa e deixar estendida no arame, para sair de casa, pegar o ônibus e ir trabalhar. Então tinha épocas em que eu perguntava para ela porque ela ficava passando trabalho com ele, sofrendo, porque não se separava dele. Ela disse que enquanto nós fôssemos pequenos, não tivéssemos as nossas vidas ela continuaria com ele. Ela aguentou, eu casei, meus irmãos casaram e ela ficou com ele porque ela gostava dele na verdade, porque se tu não gostas, tu abres mão, mas se tu gostas tu aguentas, tu achas que vai passar, vai melhorar, e então ela foi indo até o limite dela. Quando ela descobriu que ele tinha outra mulher e filho foi a gota d'água. Ela sabia que ele era mulherengo, ele saía no sábado e voltava no domingo, passava a noite fora. No momento em que ela descobriu, viu uma foto dele no aniversário de 1 aninho da filha que ele tem com a outra, não teve como se enganar mais e achar que alguma coisa ia mudar. Foi um choque.

Eu lembro que naquela época quem viu a foto foi o meu filho, o mais velho. Ele ficava muito com ela, tinha uma paixão pela avó. Isso foi em um domingo de manhã, ela me ligou e disse que o meu filho tava brincando e nos fundos da casa dela tinha um quartinho que era do meu pai, onde ele tinha as ferramentas e coisas guardadas.  Dentro de um balde de ferramentas tinha essa foto, escondida no quartinho em que a mãe jamais ia entrar. Só que o meu filho era pequeno, estava brincando e achou aquela foto. Então era para ser, era para ele achar, era para acontecer. Tudo tem um porquê nessa vida. Justamente o guri brincando achou essa foto sem maldade, ele nunca imaginou o que era. Ele pegou a foto e foi correndo mostrar para ela: “Ô vó! Olha aqui o vô!”. Quando ela olhou viu uma criança pequena, ele e uma mulher na foto entendeu tudo. Ele estava dormindo porque tinha chegado em casa de manhã. Ao meio-dia ela chamou, ele acordou e disse: “O que é isso aqui? Não precisa nem falar nada! Deu. A partir de amanhã eu vou tomar uma decisão!”. Isso foi em um domingo, aí ela me ligou e disse para eu ir buscar o meu filho porque ela precisava falar comigo e com os meus irmãos. Quando chegamos lá ela disse que no outro dia de manhã chamaria um brique, que ia vender tudo o que tinha dentro de casa porque o que tinha era dela, pois trabalhava e comprava as coisas, e iria embora. Ela só ficou com a geladeira e o resto vendeu tudo. O meu irmão que mora perto da minha casa a levou para a casa dele por um tempo, depois ela alugou duas peças e foi comprando as coisinhas de novo. Ela viveu alguns anos sozinha e hoje faz 17 anos que ela faleceu. Quando ela morou sozinha não teve um companheiro, nunca mais teve ninguém. A gente passa cada coisa nessa vida!

 Eu trabalhei desde muito cedo em casa de família, desde os 16 anos. Tinha que comer no quartinho da empregada, não podia comer na mesa com os patrões. Já passei muita coisa nessa vida e digo: “a gente tem que dar valor às pequenas coisas que tem hoje. Hoje eles têm tudo e não dão valor a nada!”. Hoje tu olhas um adolescente e ele tem roupa de marca, exige tal coisa, tem tudo e não está feliz! Eles não sabem que é preciso pouco para ser feliz! Tu não precisas de muito, precisas de paz, viver em harmonia, estar bem contigo, isso já é o suficiente! Eu sempre penso assim, sempre agradeço a Deus todos os dias pelo que eu tenho. Às vezes parece bobagem, mas agradeço pela minha casa, pelo meu emprego, pela minha boa cama para dormir, pela minha comida que não me falta nunca, pelas pequenas coisas. Na minha infância eu não tive nada disso. Se eu quisesse ver televisão ia à casa de um vizinho que deixava a porta aberta e dali eu olhava a novela. Não foi fácil a minha vida, mas são coisas que tu tens que passar, vai aprendendo com tudo e aprende a dar valor. 

Teve um caso de câncer na família, foi uma tia, irmã da mãe. Foi a única na família! Ela teve o câncer, fez a cirurgia e tirou toda a mama.  Passaram-se 20 anos e ela estava bem, tinha feito todo o tratamento, só que depois voltou. Quando voltou foi no pulmão e foi muito difícil. Ela morava em Porto Alegre e eu fui visitá-la, porque era uma pessoa que sempre me dava tudo, era minha dinda, sempre me ajudava, ela e a irmã dela que também morava em Porto Alegre e está viva até hoje. Quando apareceu o câncer no pulmão ela não durou muito, foi bem violento. Ela faleceu no hospital porque teve a função do oxigênio, pois ela tinha dificuldade para respirar, foi bem ruim. A mãe não faleceu disso, foi um aneurisma cerebral. Ela tinha saído daqui de Pelotas para visitar uma irmã dela, em Porto Alegre – a outra já tinha falecido –. Foi passar os Finados lá, para passear, passaram-se dois ou três dias e ela passou mal durante a madrugada e já entrou em coma. Ela teve um aneurisma, passou mal dormindo, deitada. A minha tia estava dormindo no quarto ao lado, aí ouviu um ronco e se levantou ligeiro, acendeu a luz, e foi ver o que era. Ela tinha se urinado, já tinha vomitado. Minha tia não ouviu nada, não sabe nem se ela chegou a pedir socorro, se ela chegou a chamar. Chamou o socorro e levaram ela para o pronto-socorro, em Porto Alegre, mas já estava em coma. Minha tia me ligou era umas 5 horas da manhã e eu estranhei quando o telefone tocou aquela hora. Ella pediu para que nós fossemos para lá porque a mãe estava no hospital com um probleminha. Eu logo pensei que não era um probleminha para ela ligar e pedir para a gente ir para lá naquela hora, era um problemão. Aí levantei, me arrumei, tomei banho, peguei a minha bolsa, liguei para o meu irmão. Ele estava com uma pescaria marcada. Acho que mais uns 15, 20 minutos e eu não falaria mais com ele porque ele já tava com tudo combinado para a pessoa pegá-lo às 5h30 da manhã. Aí eu liguei pra ele e contei que a tia tinha ligado, que tinha acontecido algo com a mãe e que tínhamos que ir lá. Ele ficou em choque, acho que não acreditou muito no que eu estava dizendo. Aí a minha cunhada ligou para Porto Alegre e falou com a minha tia. Ela contou que era grave e para mim ela não quis dizer por que ela sabia que eu ia me preocupar muito e que ia ficar muito nervosa. A mãe estava com 62 anos, A minha tia disse para irmos lá porque era grave. Logo a minha cunhada me ligou e disse que eles também iam junto comigo no primeiro ônibus. Aí ela ligou para o outro irmão, nós somos 3, e nós fomos. Fui eu, as minhas duas cunhadas e meus dois irmãos. Chegamos lá e a tia estava nos esperando em casa para dizer que era grave, que ela teve um aneurisma e que não tinha o que fazer, nós só tínhamos que esperar.
Ela durou 3 dias em Porto Alegre. No hospital, nós entramos e vimos ela toda entubada, e não tinha o que fazer. Ela faleceu no terceiro dia. A funerária foi buscá-la e nós a trouxemos para Pelotas, para fazer tudo aqui. Foi uma perda! É muito triste perder uma pessoa que ama, uma pessoa que fazia tudo por um filho, uma mãe exemplar, que vivia do trabalho para casa. Ela não sabia o que era um cinema, ela não sabia o que era nada. Trabalhava de segunda a sábado até o meio-dia, chegava e ia arrumar a casa, ia lavar a roupa, fazer o serviço dela, sempre dedicada. Eu me questionei muito, porque tu achas que nunca vais perder a pessoa, que ela vai ser eterna... teve tanta coisa que podia ter vivido com ela e não vivi! Mas são coisas do dia a dia, da tua vida, às vezes dá tempo agora, ou tu vai ligar amanhã e o amanhã passava. Eu não ligava todos os dias para ela, é tanta coisa que não custa fazer e eu poderia ter feito, mas deixei de fazer. Isso é uma coisa que a gente sempre tem que pensar, em fazer agora enquanto está aqui do nosso lado. Não deixar de ligar, não deixar de visitar, não deixar de dizer “mãe, eu te amo”. Aproveita enquanto tu tens a pessoa do teu lado e faz tudo por ela agora, porque depois tu só fica te questionando. Nunca brigamos, minha mãe nunca deu um tapa em nenhum de nós. Sempre foi uma pessoa maravilhosa, mas poderíamos ter sido ainda melhores para ela, com certeza. Às vezes nós deixamos de fazer as coisas porque não temos tempo, porque estamos ocupados com outras coisas, mas deveria ser assim: “minha mãe está aqui e eu vou aproveitar ela, vou curtir, vou ter um tempinho pra ela!”. Vou ligar para saber como ela está, e se ela não estiver bem ela vai te ligar. Não é fácil! Acho que todo mundo tem uma história de vida, todos têm uma história para contar.

O meu pai é vivo e mora sozinho. Ele viveu com uma pessoa que faleceu no ano passado. Ela perdeu a visão e teve maus momentos na vida dela. Quando a minha mãe se separou dele, em seguida ele foi viver com ela, porque não tinha porque esconder. A filha dele tem a idade do meu filho, então na época em que eu estava grávida, ele ganhou um neto e uma filha ao mesmo tempo e ninguém sabia. O meu filho tem 33 anos e essa a idade que essa moça tem. Eu nunca convivi com ela, mas hoje tem o Facebook. Ontem ela viu uma postagem do Outubro Rosa e colocou uma mensagem: “Estás curada!”. Eu nunca fui na casa dela e ela nunca veio na minha casa, mas quando eu descobri a doença ela me ligou, teve aqui com meu pai para me dar um abraço e se emocionaram comigo, mas não é uma convivência de irmão. Os meus irmãos são os dois que a minha mãe me deu, os laços. Não tem aquela convivência, não tem aquela coisa e eu não sei se tem a ver devido ao fato de ter sido uma traição, de eu gostar tanto da minha mãe e o que ele fez com ela. Eu fico pensando, minha mãe sofreu tanto, passou por tanta coisa... Ela não tem culpa, logicamente, porque ela não sabia... nem sabia que viria ao mundo, não sabia em que situação, mas minha mãe sofreu tanto por causa disso. Eu não tenho nada contra ela, tinha muita mágoa da mãe dela, porque ela sabia, quando se envolveu com meu pai, que ele era casado, que ele tinha filhos, tinha neto. Ela fazia deboche, dizia que a minha mãe era uma trouxa e eu fiquei sabendo disso depois. Dizia que a minha mãe trabalhava e não fazia nada e quem saia e aproveitava a parte boa era ela. Isso aí são coisas que machucam muito e eu convivi com tudo isso, com todas essas experiências. Como sou a filha mais velha eu presenciei tudo, foi complicado!

A respeito do câncer, a família e os amigos acabam se envolvendo, te dando força, te dando apoio... Tu precisas muito disso, do carinho dos filhos. Eu tenho dois filhos que são casados e não moram comigo. Eu sou sozinha, mas sei que eu posso contar com eles sempre que preciso. Então isso é muito importante, porque nesse momento tu ficas muito fragilizada, tu precisas de carinho, tu precisas de atenção, é muito importante tu teres essas pessoas na tua volta e também teres os amigos. Eu sempre fui uma pessoa muito espontânea, muito boa, próxima disposta a ajudar a todos. Sempre estive em função de todos e então agora eu vi o quanto isso é importante, porque as pessoas te retribuem. Tu recebes aquilo que tu deste em forma de carinho, as pessoas retribuem tudo o que tu fazes e é muito bom receber esse carinho todo no teu dia a dia, isso é muito importante. Sempre falo que, com a minha doença, aprendi que vou continuar a ser da maneira como sempre fui porque foi por esse caminho que eu vi que estou certa, sendo uma pessoa do bem, ajudando, fazendo o bem para os outros. Por isso eu recebi o bem, eu recebi a minha cura e eu estou bem, graças a Deus. O que tu és, o que tu fazes, certamente vais ter de volta, tu recebes de volta, eu acho que é bem assim...

2 anos depois... 

Embora tenha sentido muita insegurança com a situação, sigo sempre com pensamento elevado para não ficar só pensando e focando na doença, mas é claro que tenho medo, porque, como todo mundo diz, a doença volta. Voltei a trabalhar, e isso é uma coisa que ajuda muito porque tu te envolves e conversas com as pessoas e não pensa tanto na doença. Sigo sempre agradecendo! Sinto muita gratidão e agradeço todos os dias por estar viva e por ter saúde. Graças a Deus estou bem agora, passei por momentos com o tratamento em que senti muito cansaço, muitas dores nas pernas por causa da medicação e mais a questão da menopausa. Essas dores nas pernas me fizeram perguntar: “Meu Deus! O que é isso?”, pois era muita dor, muito cansaço, de não poder me abaixar... mas nunca desanimei. Então o médico oncologista trocou a medicação, e tentamos outra para ver se haveria melhora. Foi o que aconteceu, passou. Então não podemos desanimar, a gente tem que sempre seguir! 

Essas dores surgiram no período em que eu tinha acabado as quimios e tinha começado a tomar um remédio que causa algumas dores musculares, tipo dores nas pernas. Eu troquei duas vezes esse medicamento, que é preciso tomar por um período de cinco anos. Quando eu comecei a tomar o primeiro as dores eram muito fortes. Se caísse alguma coisa no chão era muito dolorido para me abaixar. Aí eu falei sobre isso com o oncologista e decidimos trocar. Quando ele trocou realmente foi aliviando e hoje eu não sinto mais. Eu sigo o tratamento, vou de seis em seis meses às consultas, faço a mamografia, o ultrassom e vou ao ginecologista. É preciso ter um controle!  Não é porque eu estou bem e que fiz o tratamento que eu vou deixar de me cuidar! Vou no oncologista, que me pede todos os exames, e mesmo assim vou também ao mastologista. Eu não relaxo! No mastologista vou ir apenas uma vez ao ano e ao oncologista de 6 em 6 meses. Esse último solicita inclusive outros exames, se eu sentir algo de anormal. Ele me cuida muito bem! 

O que mudou em mim depois disso foi que antes eu era muito detalhista, antes de sair de casa para trabalhar olhava para ver se estava tudo nos seus lugares. Eu sou assim, mas hoje um pouco menos. Hoje eu penso: “se dá para fazer agora, se faz, se não dá, deixa para depois". A gente muda, mesmo que pouco, mas muda. Antes lavava as janelas uma vez por semana, agora não. Hoje penso no meu braço, que eu não posso ficar fazendo muita força e que tenho que ter cuidado. As janelas estão aí e vão ficar, e se eu tiver que lavar uma vez por mês, ou de dois em dois meses, tudo bem. Agora eu penso mais em mim, coisa que antes eu não fazia. 

Sobre a fé, ela aumenta mais. Tu sabes que tu podes contar com Deus e sabes que, por mais difícil que seja, nem sempre as coisas são como a gente quer.  Tu podes pedir e Ele vai atender às tuas necessidade na hora que Ele achar que tem que ser, e não na hora que queremos. Então, por mais difícil que seja, eu agradeço, eu não peço nada a Deus a não ser saúde. Eu só agradeço todos os dias pelo dia de hoje, pelo meu trabalho, pela minha vida, pela minha saúde, pela saúde dos meus netos e da minha família, isto.  O que é mais importante na tua vida? Não adianta o dinheiro, não adianta nada se tu não tens saúde. O dinheiro até ajuda para comprar uma medicação, mas a cura não é o dinheiro que vai te dar, é Deus, e isso vai acontecer no momento Dele. Por tudo que passei agradeço a Deus porque ele me aliviou das coisas piores. Sempre digo que em tudo isso que passei Deus estava sempre ali. Então não posso dizer que a minha quimioterapia foi horrível, porque não foi. Tem momentos, claro, que tu fica fragilizada e debilitada, mas nada foi horrível, nem o momento da cirurgia. Sempre fui muito bem atendida! No momento de Deus ele fez tudo e cada vez eu acredito mais Nele.

“Eu gosto quando ela está feliz”

"Eu sou Helena Soares Perez, tenho 8 anos e quando vi minha vó doente, sentada no sofá o cabelo estava caindo. Eu gosto quando ela está feliz, sem dor, e nós até brincamos às vezes. Então eu gosto mais de quando a minha vó está boa do que ruim e eu gosto muito dela" (Helena, 8 anos, neta da Clair).

Pela minha família eu faço qualquer coisa. Tu quer e quer viver por eles. Eu tenho dois filhos, mas hoje eu quero viver pelos meus netos. Os filhos já estão criados e já tem a vida deles, mas esses pequenininhos estão começando.  A Martina, de 2 anos, me chama de vovó Caquinha ou vovó Cacá. Então eu só quero viver, quero estar bem para estar perto, para ficar com eles. Nessa fase a melhor coisa que tu pode receber é um carinho, deles estarem na tua volta. Esse carinho das minhas netas foi muito importante no meu tratamento. A Helena, e a Lívia viviam coladas em mim fazendo carinho na minha careca e dizendo que eu estava linda. Já a Martina ainda estava na barriga da mamãe quando eu estava fazendo as quimios.

A Martina nasceu no dia do meu aniversário, quando eu estava terminando o tratamento, dia 11 de julho. Eu estava carequinha e ainda tenho as fotos que tirei no hospital. Essas crianças são tudo para mim! E a Helena é muito emotiva, ela chora e se emociona comigo. No Lançamento do Projeto Laços da Mama ela chorava de soluçar. Se emocionou quando leu no painel o meu depoimento de que ela e a irmã foram muito importantes no meu tratamento, que me ajudaram muito e que estavam sempre comigo.

“Eu ficava com medo de perder ela”

Quando a vó ficou doente eu acho que ela não tava feliz. Eu senti medo quando ela me contou que estava com câncer. Eu ficava com medo de perder ela. Me dava um aperto no coração porque eu achava que ela não ia conseguir. Então quando ela perdeu o cabelo eu não me importei muito, porque era só um cabelo e ia crescer de novo. A mensagem que eu quero deixar para a minha vó é que eu a amo muito e que sempre estou com ela. Ela me ensinou a ficar forte. Hoje ela sorri mais, porque ela venceu o câncer. 

Minha mãe também está com câncer e acho que o câncer dela é até mais sério do que o da minha vó, porque o da minha vó era dos hormônios e o da minha mãe é diferente. Eu sinto que a minha mãe já venceu o câncer, então está tudo bem, pois ela está fazendo quimio agora. Então o que eu quero dizer para ela é que eu a amo muito e que sei que ela já venceu o câncer, eu sei que ela vai vencer! (Lívia, 12 anos. Neta da Clair).


>> a história da Clair está no livro Laços da Mama acompanhada de fotografias emocionantes <<

AJUDE OUTRAS MULHERES! Adquira o livro AQUI  

Tags

câncer de mama iba instituto buquê de amor pelotas rio grande do sul histórias de vida laços da mama